sábado, 10 de novembro de 2007

Cultivar

Se a terra é boa, revolvida e limpa, aguada, recebe o calor do sol e a dedicação do homem, a planta vai crescer e ficar linda. Um solo forte, terra cheirando à terra, água limpa e muito cuidado fará com que seja bonita como uma criança. Plante uma planta em terra nada fértil, suja e sem espaço. Quando voltar para vê-la, cuide somente de jogá-la no lixo.
Arrebanhe um animal de estimação, dê-lhe pouca atenção, pouco banho, não cuide de suas dores, não mate sua fome e sede, não o leve nunca à passear e não deixe nunca o sol lhe aquecer e espere ele morrer.
Deixe uma criança sem amor, carinho e atenção, não brinque com ela, não lhe conte nunca uma estória e sequer lhe faça um cafuné e espere que um dia ela lhe diga: Não!

Que importa?

Que importa? Não importa data, em qual ano, mês ou dia, se domingo, sábado ou segunda. Não importa se passou ou se ainda passará. Importa o sentimento, se existiu ou ainda existe.
Importa, sim, o momento daquele instante ímpar, daquele momento em amor ou em dor, a alma cantando ou o coração chorando. Importa somente se um amor chegou ou partiu, se a vida existe ainda ou se esvaiu.
Eu estava lá, não importa se em uma cadeira, no chão ou em um sofá, se em volta de uma mesa redonda, quadrada ou uma mesa de bar. Não importa se na noite revoltosa ou em um começar de dia em morte. Que importa se numa tarde quente ou na sala da casa de alguém?
Nada disso importa, somente que as pessoas correm, que a mente grita, o peito dita sua dores ou seus amores. Somente importa que eu estava lá, seja no começo de mais um ano ou no fim de uma vida.
Nada, nada disso importa. É só viver de verdade no começo do dia ou no cair da noite.

Apenas relatando

Chega um dia e os inocentes veem a luz.
Chegam de um pequeno mundo, aconchegante, confortável e prazeroso.
Na maioria das vezes gerados com muito amor, em outras simplesmente ao acaso.
Descem as cortinas, chegam conflitos e dores.
Inocentes, dependentes e logo crianças carentes.
Presentes, sorrisos e fotos.
O tempo passando, conhecendo seu mundo.
Dando seus passos no descompasso dos pais.
Por vezes brinquedos novos e restos de quebra cabeça, bonecas na caixa, pedaço de um cavalinho ainda em desalinho.
O branco, o louro, o negro, o mulato, o japonês, o americano e o alemão.
O amor é passado dentro dos limites, ainda que um limite invadido por tudo.
A falta de pão na mesa, a qualidade da vida agredida, pisada pela própria vida, puxada, quebrada, corrida.
Impotência sem bula para ler.
Gritos, castigos e os pequenos querendo entender.
As disputas, as brigas, cade o biscoito?
A bola já não rola, a mãe morreu. O pai, um ausente, prepotente.
Ama-se, a paciência é pouca, o adulto é grande e a criança pequena.
O mundo colorido, o perigo uma brincadeira.
A chuva chega, o portão aberto, a rua.
Um pequeno cachorro, um brinquedo de pêlos.
Chega a hora de dormir, tem que ter estória.
Nela, nariz grande, bruxa malvada, fada para salvar.
Gigante, festas grandes, carrosel girando no ar.
Balanços no parque, gira-gira a rodar.
O dia a dia, o cotidiano.
Cortam a luz, perde-se o emprego, o amor se acaba, os pais se perdem os pequenos nada entendem.
Em mim existe o amor e a preocupação mas me roubam as ilusões!